O Amor Parental: Um Exercício de Ser

Ivo Fernandes • 2 de abril de 2025

"Reflexões sobre o amor que escolhe permanecer, mesmo quando não é requisitado."

Amar é uma condição que poucos alcançam. Amar com maturidade é ainda mais raro. E amar gratuitamente — sem esperar retorno — é um grau elevado do amor, o que chamamos de amor materno ou paterno.


Esse tipo de amor não é natural, não está necessariamente ligado aos genitores. Temos provas suficientes de que parir não gera amor automaticamente, e nem mesmo criar garante afeto genuíno. A fantasia de um amor inato, biológico, serve muitas vezes para aliviar nossa sensação de desamparo. Mas a realidade é mais dura: o amor verdadeiro, incondicional, é uma construção.


Ainda assim, o amor materno/paterno existe — e alguns conseguem alcançá-lo. Eu estou nesse caminho.


Tornei-me pai pela primeira vez aos 18 anos. Fui tomado por uma sensação maravilhosa, e essa emoção se repetiu nas outras duas vezes em que novamente me tornei pai. Mas, olhando para trás, percebo que, em todos esses momentos, ainda não era o verdadeiro amor paterno que operava em mim. Instintos e fantasias se misturavam, confundindo-se com o que eu achava que era amor.


Amei, sim — de um jeito — e fui aprendendo a amar ao longo dos anos. Porque o amor, como a filosofia, é um exercício de ser.


Durante muito tempo, amei como filho aos meus filhos. Projetava neles a carência que eu mesmo carregava por nunca ter tido, de fato, um pai — senão aquele que me deu seu sêmen. A ausência paterna me impeliu a ser um pai cuja presença fosse incontestável, para que meus filhos jamais sentissem em mim a ausência que eu senti. Mas aprendi, com o tempo, que isso é impossível — inclusive para o bem deles.


Sofri profundamente com as separações das mães. Doeu não poder estar o tempo todo com cada um dos meus filhos. Tentei, então, ser o melhor pai que pude — até perceber que não ocupava, para eles, o lugar de importância que imaginei ocupar. E fui sentindo, aos poucos, o peso não mais da ausência do pai, mas dos próprios filhos que faziam escolhas que não me incluíam necessariamente.


Sim, os filhos deixam os pais — e, na maioria das vezes, pouco se importam com isso. Com raríssimas exceções. Por isso, muitos pais precisam aprender a viver e a amar mesmo quando os filhos já não estão mais ali. Eles seguem suas vidas sem te consultar, e isso pode acontecer bem cedo. Para quem passa por essa experiência, o desafio de amar se torna ainda maior.


É nesse ponto que se aprende o amor gratuito — aquele que não depende da resposta do outro. Aprende-se a amar mesmo quando o outro não merece, porque não se trata de merecimento. Trata-se de escolha, de disposição interior, de graça.


Hoje, amo meus filhos para além do amor que eles têm por mim. Já não é mais sobre mim. É sobre eles. Sei que estarei sempre aqui, disponível — mesmo que escolham caminhos que se afastem de mim. Abençoarei suas partidas e celebrarei seus retornos.


Nunca tive um pai para quem voltar, nem um de quem me afastar. Eu sou aquele que pode sofrer o abandono e, ainda assim, se alegrar com o retorno. Porque decidi me colocar nesse lugar de amar.


Isso é uma decisão. Uma disposição do espírito. E isso é muito mais do que uma emoção.


O amor parental, quando verdadeiramente vivido, é divino. Porque ama com graça — como um favor imerecido.


Ivo Fernandes

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